Como planejar sucessão com possível aumento do imposto sobre herança?

Ouvi falar sobre a possibilidade de aumento do imposto sobre herança em São Paulo com o projeto de lei 250/2020. Queria fazer um planejamento sucessório para transmissão de patrimônio. O que devo levar em consideração nesse contexto?

Jaques Cohen, CFP, responde:

Caro leitor,

Com a covid-19, o Estado de São Paulo voltou a discutir o aumento do Imposto sobre Transmissão Causa Mortis e Doação (ITCMD). Hoje ele cobra 4%, mas, como permitido pela União, o projeto citado propõe alíquotas escalonadas até 8%.

Em sua pergunta, você não menciona valores — o que pode fazer diferença. Isso porque, apesar do teto mais alto, as isenções da proposta são mais amplas.

De acordo com nossos cálculos, impostos sobre doações só atingiriam os atuais 4% a partir de aproximadamente R$ 690 mil. Transmissões após a morte o fariam após cerca de R$ 1,66 milhão. Depois desses valores, o imposto efetivo passaria a ser mais alto. Mesmo abaixo disso pode fazer sentido, porém, antecipar a transmissão, já que a base de cálculo também poderá ser afetada.

Aliás, esse projeto não é o único que trata do assunto. O recente projeto de lei 529/2020 também versa sobre alterações no ITCMD, só que não mexe na alíquota de 4% nem propõe um escalonamento. Os dois projetos afetam a base de cálculo.

Destaque para bens imóveis, que seriam avaliados de forma mais rígida, a mercado. Hoje a capital São Paulo utiliza um cadastro específico. As demais prefeituras utilizam o valor venal para imóveis urbanos e, para os rurais, o valor declarado para fins de ITR.

As mudanças valeriam também para instrumentos mais sofisticados, como holdings imobiliárias, que seriam responsabilizadas pela atualização de seu patrimônio a valor de mercado.

Qualquer que seja o caso, uma análise dos cenários pode oferecer um norte sobre quando e como proceder com a transmissão.

Cabe frisar que não é certo se algum dos projetos irá vingar, nem por quais alterações passarão em trâmite.

Um ponto controverso diz respeito aos planos de previdência VGBL e PGBL. Hoje o valor que cabe aos beneficiários deles não está sujeito ao ITCMD, enquanto os projetos preveem a tributação. Acontece que, em relação ao VGBL, já existe decisão do Superior Tribunal de Justiça (STJ) isentando-o de processos e custas de ITCMD. Assim, o VGBL continua um instrumento a ser considerado.

Ao passo que concentrar todos os investimentos em um nos deixa limitados, usar o VGBL na medida para reduzir a base de cálculo pode ser uma alternativa. Citadas as possíveis mudanças, destacamos outros pontos a levar em consideração:

  • a possibilidade de doação com reserva do direito de usufruto, que permite manter controle sobre ativos e seus rendimentos;
  • a divisão, por lei, da herança em duas metades. Uma disponível, que pode se dar conforme testamento, e outra legítima, que cabe, em linhas gerais, a descendentes e cônjuge. Para o cônjuge, é aplicada a meação conforme o regime de casamento; depois disso, o direito à herança recai apenas sobre a parte do patrimônio não sujeita a ela.

Por exemplo, no caso de comunhão universal de bens, a meação recai sobre o todo, não havendo parte na herança; e, no caso de separação total de bens, não existe meação, mas o cônjuge participa da divisão da legítima com os demais herdeiros.

Por fim, é importante falar de outros benefícios de um planejamento sucessório, como economia de despesas judiciais e advocatícias — e de tempo, já que se opera automaticamente —, bem como a precaução de conflitos familiares na divisão.

Mais importante ainda é não se esquecer que isso tudo passa necessariamente por questões pessoais e afetivas. Ao lado dos pontos destacados, é preciso se perguntar o que desejam as partes envolvidas e como elas têm se comunicado — falado e se escutado — em relação ao tema.

“As respostas refletem as opiniões do autor, e não do jornal Valor Econômico ou da Planejar. O jornal e a Planejar não se responsabilizam pelas informações acima ou por prejuízos de qualquer natureza em decorrência do uso destas informações”.

Este conteúdo foi publicado originalmente no site do Valor Econômico

Fonte: Valor Investe.